27 October, 2005

A EDUCAÇÃO SOB FOGO CERRADO


Só hoje tomei conhecimento da entrevista de Julio Groppa Aquino à Carta Capital de 19 de Outubro, número 364. Pouca gente comentou, acredito que pelo mal-estar que deve ter causado.

O professor ataca com ferocidade a escola (pública e privada), professores, secretários, autores. Não sobrou nada nem ninguém.

Aquino exagera e generaliza em muitos momentos, mas vale pela polêmica que suscita e por chamar a atenção para algumas realidades da educação. Seu olhar, velado pelo negativismo, não alcança, entretanto, novos caminhos que estão se desenhando.

O texto pode ser visto, na íntegra, em: http://www.cartacapital.com.br/index.php?funcao=exibirMateria&id_materia=3198

Eis aqui alguns trechos:

sobre as escolas e alunos em geral:

  • "As escolas são lugares abandonados do ponto de vista intelectual. Nisso a escola privada e a escola pública não têm diferença significativa. A estratégia do abandono dos alunos da escola pública tem a sua contrapartida na teatralização da escola privada. Em ambas, pouco de inteligente se constrói. Dialogamos muito pouco com a cultura acumulada, sempre recomeçamos do zero. "

  • " Meus alunos chegam à USP e não sabem escrever, raramente lêem. Seriam reprovados num ditado. "

  • "Praticamos uma espécie de educação self-service, ou prêt-à-porter, antagônica à idéia de educação como conservação do mundo. A Hannah Arendt defende o aspecto conservacionista da educação, muito distinto do conservadorismo."

sobre as escolas privadas:

  • "As escolas privadas são a cara da elite brasileira. Fazem parte do seu “pacote existencial”: academia, shopping, condomínio fechado, escola privada. Elas vendem aquilo que a elite quer: uma farsa com fachada de excelência. O processo de desinstitucionalização escolar, que na escola pública assume a forma de deserção, na escola privada confirma-se como fraude pedagógica. Não há o mínimo de supervisão, de controle."

  • "As escolas privadas transformaram-se em lugares de mero adestramento intelectual. Não há uma vírgula de diferença entre escolas de proposta x ou y. Em geral, todo o trabalho sustenta-se na idéia de transposição da informação enciclopédica que cai no vestibular. As escolas privadas tornaram-se treinadoras de prestadores de vestibular."

sobre as escolas públicas:

  • "Qual foi o problema que se impôs antes da abordagem de questões pedagógicas estruturais? O absenteísmo docente. Isso precisa ser dito: não conheço uma única escola pública que conte, em apenas um dia do ano letivo, com todos os seus profissionais presentes. Com esse diagnóstico, fizemos uma reunião com todas as escolas e eu propus um pacto de cem dias sem faltas. Fui vaiado por praticamente todos que lá estavam. Veja que eu estava defendendo um princípio. Os alunos têm o direito de ser atendidos, e da melhor maneira possível."

sobre os agentes pedagógicos

  • "Em meados deste ano, a Folha de S.Paulo publicou um caderno especial intitulado Colégios, em que mostra o cotidiano das escolas campeãs do vestibular. E o que lá se vê? Hiperconcorrência entre os alunos, “baias” individuais, avaliação frenética, vigilância digital, exclusão sistemática dos “mais fracos”. Um dos destaques é o Colégio Objetivo, que pertence ao “barão” do modelo escolar vigente, o senhor (João Carlos) Di Genio. Não dá para acreditar que essas “corporações” espalhem impunemente seus horrores pedagógicos e que a imprensa seja servil a isso tudo. É preciso ter coragem para desmascarar esse estado lamentável das coisas na educação, seja particular, seja pública."

  • "Estamos cercados desses repetidores midiáticos, como o Gilberto Dimenstein. Gente que prega o “aprender a aprender”, “aprender a fazer”, “aprender a ser” etc. Clichês que pouco significam quando confrontados com a prática escolar. A educação exige uma certa solidez clássica. E não me venham dizer que as novas gerações não estão interessadas nisso. Elas são a cara do que a gente oferece para elas. Damos alfafa e reclamamos da falta de massa crítica. "

  • " Na penúria em que nos encontramos, pode faltar pão, mas não o circo. Esse é o efeito principal da onda de auto-ajuda pedagógica que assola as escolas atualmente. Um dos campeões do palavrório é o atual secretário da Educação do Estado de São Paulo (Gabriel Chalita). E olha que as escolas estaduais paulistas estão em situação ainda pior que as do município. Outro “poeta” da educação é o Rubem Alves, autor bastante reconhecido entre os educadores e na mídia. Eles que me perdoem, mas eu considero essa atitude leviana, para dizer o mínimo. A situação é muito grave para que possamos arrancar aplausos fáceis, fazer correr lágrimas comovidas de olhos mais sensíveis – ou míopes – e ter o sono dos justos."

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